sábado, dezembro 29, 2007

# CCXXVIII - E, para 2008, desejo...

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(Dezembro de 2007, para alguns era Natal)

Num dos cafés chiques, duma zona bem do Porto. Dezembro, frio nas ruas e tempo de Natais.

O miúdo vai percorrendo as mesas do café, deixando o olhar enorme em cada rosto que fixa. Tenta vender pensos (tentará comprar algum Natal?). Alguém mais sensível deita-se à conversa com ele. Se tem fome, pergunta-lhe. Se quer alguma coisinha para comer, insiste. Que não, que não... que só quer vender pensos. E a alma sensível quer saber o preço dos pensos. E dá-lhe a moeda pretendida - mas não quer os pensos. Conta-lhe que assim ganha a dobrar - porque pode vender depois os pensos a outros. O miúdo, do alto da sua dignidade, recusa. E obriga a alma sensível a ficar com os pensos.

Alguém aproveita a ocasião e prende para sempre aquele olhar numa foto. A sorrir para o miúdo, dá-lhe a ver o lindo que ficou. Na sua cabeça, a voz da Isabel Silvestre canta-lhe "E o menino lindo, não nasceu p´ra fazer mal".

... que não haja "soldadinhos" nestas guerras. É isso que desejo para 2008!

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A ronda do soldadinho (José Mário Branco)

Um e dois e três / era uma vez um soldadinho / de chumbo não era / como era o soldadinho / Um menino lindo / que nasceu, num roseiral / E o menino lindo / Não nasceu p'ra fazer mal / menino cresceu / Já foi à escola de sacola / Um e dois e três / Já sabe ler sabe contar / Menino cresceu / Já aprendeu a trabalhar / Vai gado guardar / Já vai lavrar e semear.

Um e dois e três / era uma vez um soldadinho / de chumbo não era / como era o soldadinho / Menino cresceu / Mas não colheu de semear / Os senhores da terra / O mandam p'ra guerra / morrer ou matar / Os senhores da guerra / Não matam, mandam matar / Os senhores da guerra / não morrem, mandam morrer / E a guerra é p'ra quem / nunca aprendeu a semear / É p'ra quem só quer / mandar matar, para roubar

Um e dois e três / era uma vez um soldadinho / de chumbo não era / como era o soldadinho / Dancemos meninos / a rosa no rodeiral / que os meninos lindos/ não nascem p'ra fazer mal / Soldadinho lindo / era o rei da nossa terra / fugiu para França / P'ra não ir morrer na guerra / Soldadinho lindo / era o rei da nossa terra / fugiu para França / P'ra não ir matar na guerra...




sexta-feira, dezembro 21, 2007

# CCXXVII - Mudamos. Não nos mudam...

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(Sombras. Espelhos? - Dez'07)

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Just as you are - Robert Wyatt & Mónica Vasconcelos

[Monica Vasconcelos]
It's that look in your eyes
Telling me lies
So many promises broken
What can I do?
What should I do?
Try to love you just as you are

'cause I'm never going to change a thing about you
Never ever going to change a thing about you
Try to love you just as you are

Should I leave, Should I stay
Should I call it a day
There's so much to say that's unspoken
In your way you've been true
But all I can do
Try to love you just as you are

'cause I'm never going to change a thing about you
No I'm never ever going to change a thing about you
Try to love you just as you are

[Robert Wyatt]
It's that look in your eyes
I know you despise me
For not being stronger
What can I do?
What should I do?
I've always loved you just as you are

And I've never tried to change a thing
Never tried to change a thing about you
Always loved you just as you are

Will you leave, will you stay?
There may come a day
When I'm weak and I'm stupid no longer
In my way I've been true
I've lived just for you
I've always loved you just as you are

I've never tried to change a thing
Never tried to change a thing about you
Always loved you just as you are








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Fixando-se profundamente na negritude daquele olhar magnético, questionou-o:

- E como saberemos se é essa a pessoa certa?

Sem por um só momento afastar o olhar envolvente, o Petit Prince - continuava a gostar que o chamasse assim - foi, como sempre, surpreendente:

- Saberás. Acredita-me.

A pausa, matematicamente premeditada, fez-se sentir como uma pedra quebrando a aparente quietude das águas mortas de um lago em hibernação.

Ainda como que sob o efeito das ondas formadas pela acção da pedra - e como as sentia, nessa noite! - ouviu-o:

- A pessoa certa para ti, nessa altura, será aquela que fará crescer em ti uma vontade incontrolável de lhe cantares o "Just as you are" do Robert Wyatt...

domingo, dezembro 16, 2007

# CCXXVI - Divas - Vinte e um - Dee Dee Bridgewater

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(Nos autógrafos, o sorriso foi quem mais reinou...)


Porto, Casa da Música. Noite de 15 de Dezembro. 2007 verte os seus derradeiros dias, mas ainda deixa ficar na sua História este encontro da Orquestra de Jazz de Matosinhos com a diva Dee Dee Bridgewater.

Muito bem disposta, muito comunicativa, muito pessoa - Logo na primeira canção conquista o público ao distrair-se... e ao dizer :

"Ooooops! Também sou humana. Também tenho os meus enganos. Podemos fazer melhor. Vamos tentar..."


E se brilharam...

Algum exagero na brincadeira de tentar dizer os nomes dos músicos. Muita simpatia. Muito Jazz. Alguma emoção... E as canções antiguinhas do Jazz ali a desfilarem perante nós. Uma eficiente Big Band, uma performer de excepção e quase (ou)víamos Ella a cantar-nos. Um scat incrível. A voz instrumento de eleição...


Que outro destino poderia ter a filha de um músico que acompanhava Dinah Washington?

Uma noite a fazer parte das (boas) noites que nos ficam na memória...Contente por mergulhar naquele mundo jazzístico fascinante. Com pena por ter a diva em frente e não ouvir as canções do J'ai deux amours e, sobretudo, as do seu maravilhoso álbum de homenagem à música do Mali, Red Heart. Um cd obrigatório para os amantes de boa música!

Dee Dee lembrou-nos (antes de cantar Georgia) um dueto que fizera com Ray Charles... Fica aqui em audição.



Precious Thing [till the next... somewhere]
Dee Dee Bridgewater & Ray Charles

Take your ring
Isn’t it strange you're always leaving things
Never mind I know this rule is not a whole
I hope I made you feel less alone
Think of me while you roam

It is no strange
But it’s more, more than just a night of fling
There are things I believe should never be told, girl no
But you’re the only one I want to hold
Cause it can get awfully cold

Precious thing
You know our love is
such a wonderful thing
You make me dizzy whispering in my ear
Send my love to the next, somewhere

Dee Dee, Keep the ring
Ain’t it funny, right
I’m always losing things
But you’re like me you’ve known roaming
I hope I made you feel less alone
Think of me as you roam

Oh, precious thing
You know our love is
such a wonderful thing
Girl, you make me dizzy whispering in my ear
It’s you my love, till the next, somewhere

You say no strings
But freedom is still as
much yours as my thing
I know promises can be hard to keep
The price I paid to
learn, oh baby was just
too steep
But my still my love runs deep

(Both)
Precious Thing
You know our love is such
a wonderful thing
You make dizzy whispering in my ear
Soon my love. Till the next…somewhere.





quarta-feira, dezembro 05, 2007

# CCXXV - Da loucura / dos loucos...


[Algures da net]





Balada do louco (1986)
Composição: Arnaldo Baptista/ Rita Lee
Interpretação: Ney Matogrosso

Dizem que sou louco / por pensar assim
Se eu sou muito louco / por eu ser feliz

Mais louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz

Se eles são bonitos, sou Alain Delon
Se eles são famosos, sou Napoleão

Mais louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz

Eu juro que é melhor
Não ser o normal

Se eu posso pensar que Deus sou eu
Se eles têm três carros, eu posso voar
Se eles rezam muito, eu já estou no céu

Mais louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz

Eu juro que é melhor
Não ser o normal

Se eu posso pensar que Deus sou eu
Sim sou muito louco, não vou me curar
Já não sou o único que encontrou a paz

Mas louco é quem me diz
E não é feliz, não é feliz....eu sou feliz


terça-feira, novembro 27, 2007

# CCXXIV - Louca?


[Algures da net]




A MI MADRE LE DECÍAN "LOCA"

A mi Madre le decían loca, pero no era loca, era profesora. Hablaba diferente. Decía: "Los ojos sirven para escuchar". Yo tenía diez años de edad. Un niño no comprende el lenguaje vertical y pensaba que quizá mi madre era loca. Cierta vez me armé de valor y le pregunté: ¿Com qué miramos? Mi madre me respondió: "Con el corazón".

Cuando mi madre se levantaba de buen humor cantaba: "Hoy me he puesto mi vestido de veinte años". Yo sabía que no tenía veinte años y la miraba, nada más. ¿Qué puede hacer un niño, sino escuchar? Si mi madre estaba triste, decia estar vestida de niebla.

"Hoy tengo ochenta años"- dijo -, cuando desaprobé un curso. Al fin pude terminar la educación primaria. El día de la clausura llegó tarde. Se disculpó diciendo: "Hijito, me demoré porque estuve buscando mi vestido de Primera Comunión, ¿No ves mi vestido de Primera Comunión?". Miré a mi madre y no estaba vestida de Primera Comunión.

Después tuvo ese accidente fatal. Me llamó a su lado, cogió fuerte mis manos y dijo: "No tengas pena, la muerte no es para siempre" . Pensé: mi madre no se da cuenta de lo que habla. Si uno muere es para siempre. Era niño y no entendía sus palabras.

Ahora tengo cincuenta años y recién comprendo sus enseñanzas. Sí, Madre. Podemos tener 20 años y al día siguiente ochenta. Todo depende de nuestro estado de ánimo. Los ojos sirven para escuchar porque debemos mirar con atención a quien nos habla. Para conocer la realidad esencial de una persona, tenemos que mirarla con el corazón. La muerte no es para siempre, sólo muere lo que se olvida y a mi madre la recuerdo porque la quiero. Ahora -en sueños platicamos- nos reímos de su método de enseñanza. Aprendí a mirar con el corazón.

Una noche me dijo: "He notado que te molestas si tus amigos te dicen "loco" y eso no está bien. Es natural que el hijo de una loca sea loco". Entonces -por primera vez- repliqué a mi madre y le dije: "Madre, te equivocas, no siempre el hijo de una loca tiene que ser loco; a veces es poeta". Por eso puedo decir con orgullo: "A mi madre le decían loca, pero no era loca, era profesora. Me enseñó a descubrir la vida después de la muerte".



Max Dextre [Abril de 1936 - Marzo de 1998] - Destacado poeta, periodista cultural y conferencista peruano.




[Extracto de Bargo Negro - Mariza, de novo]

segunda-feira, novembro 19, 2007

# CCXXIII - Desejos vãos...

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(No Douro, entardecia...)




"Mas o mar também chora de tristeza!
As árvores também, como quem reza,
erguem aos céus os braços como um crente..."
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(Florbela Espanca)
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(Mariza)

segunda-feira, novembro 12, 2007

# CCXXII - Ei-la...


(Imagem daqui)

... a melancolia feita voz, de regresso. Considerada como a mais desalinhada das nouvelle artistes , uma Madeleyne Peyroux cá do burgo, Lula Pena - voz e guitarra, sempre - brilhou no Maxime, em Lx, e vem ver-nos esta sexta-feira, no Passos Manuel, cá no Porto.

Imperdível... até porque não se sabe se (nem quando) voltará.

Se mal me pergunte... para quando o segundo disco, hein? O tal Profissão de Fé, que se seguiria a Phados? É preguicite?

Fica um pouquinho do que se ouviu no Maxime:



domingo, novembro 04, 2007

# CCXXI - Jacinta, com Zeca na sua Voz


(Uns olhos sorrindo, um sorriso espreitando...)



Em Outubro visitou-nos no novo BFlat (saudades do velhinho... sem putos em altos berros de Parabéns a você...).
Trazia a música de Zeca Afonso para nos mostrar. Já a ouvíramos a cantá-lo, em doses que sabiam a pouco, nos concertos do Daydream e do Tributo à Bessie Smith. Agora, temos um cd todo dedicado à música dele, revestida com tonalidades jazzísticas... e muito bem, diga-se.
Longe daquela menina escuteira que Portugal conheceu a cantar Ella Fitzgerald, Jacinta é uma estrela Blue Note.
Aqui, fez-se acompanhadar (de forma mais do que convincente) apenas pelo piano do Rui Caetano dando ao encontro um intimismo acolhedor.
Foi um espectáculo muito, muito agradável.
O Zeca continua (sempre) a saber a pouco...
E Jacinta continua a maravilhar-nos nos blues. Arrebatadora, quando se põe a cantar blues...
No cd, Jacinta reescreve com versos roubados aqui e ali, das canções que reinterpreta, um novo poema. Gostei da ideia. Arrisco uma composição:

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Quem te não ama não vive

Numa barquinha a dormir

vinha em sentido diferente

No quarto das danças
revelavam-se ondas.

Muito à flor das águas
umas voltam outras não

Um pouco de maresia

Ali nem o céu se calou
Chega-te à minha janela
Teu corpo pertence à terra que te abraçou

Para então dizer ao mundo...
Eu quero ir ao outro lado...
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Uma das minha favoritas de sempre é este Cantigas do Maio:

Eu fui ver a minha amada/Lá p'rós baixos dum jardim
Dei-lhe uma rosa encarnada/Para se lembrar de mim

Eu fui ver o meu benzinho/Lá p'rós lados dum passal
Dei-lhe o meu lenço de linho/Que é do mais fino bragal

Eu fui ver uma donzela/Numa barquinha a dormir
Dei-lhe uma colcha de seda/Para nela se cobrir

Eu fui ver uma solteira/Numa salinha a fiar
Dei-lhe uma rosa vermelha/Para de mim se encantar

Eu fui ver a minha amada/Lá nos campos eu fui ver
Dei-lhe uma rosa encarnada/Para de mim se prender

Verdes prados, verdes campos/Onde está minha paixão
As andorinhas não param/Umas voltam outras não

Refrão:
Minha mãe quando eu morrer/Ai chore por quem muito amargou
Para então dizer ao mundo/Ai Deus mo deu... Ai Deus mo levou





domingo, outubro 14, 2007

# CCXX - Daqui (Palácio do Freixo, Porto) e Dali (Salvador)


(A exposição está pertinho...)



(... com os bilhetinhos na mão...)


(... deixámo-nos impressionar pelas obras de Salvador Dali!)


Esta exposição vale!


É impossível não ficar emudecido perante um Cristo de S. João da Cruz, datado de 1974 e sem a cruz, sem as chagas, sem a coroa! Um único prego sustenta Cristo, provocando-nos claramente. Que dizer perante a força da escultura Nu a subir escadas(1973), uma mulher a subir um caracol, e pensando na irreverência do artista ao responder, desta forma, ao Nu Descendo uma Escada, de Marcel Duchamp (que se tornaria precursor dos movimentos futurista e dadaísta)?
E de Paternoster (1966) as nove xilogravuras com o texto da oração Pai-Nosso em nove línguas diferentes ?
E da Bíblia Sagrada? E do Perseu, acima mostrado? E como falar do espanto perante o D. Quixote Sentado e, muito particularmente, ao ver (de foma algo limitada, confesso, apesar do jogo de espelhos, gostaria de ter dado uma volta de 360º àquela obra) Dragão-Cisne-Elefante - sabendo que Dali adorava cisnes e afirmava que estes eram a forma que os anjos assumiam para descer à Terra, que o aterrador Dragão era a encarnação do mal e que Dali tinha na sua casa de Port Lígat, por cima da porta, uma tromba de elefante?


Ouvia-se Nina Pastori, evocando Espanha.


Mas, perante tanta genialidade, loucura e fantasia, deixo a versão de John Williams do tema de Alonso Modarra (Séc. XVI), denominada Fantasia:








terça-feira, outubro 09, 2007

# CCXIX - A importância de se chamar Ernesto


"Acima de tudo procurem sentir no mais profundo de vocês qualquer injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo. É a mais bela qualidade de um revolucionário"
Ernesto (Che) Guevara.



Pelas 13h 10 min de hoje. 40 anos passaram desde o seu assassinato.
- Você vem aqui para matar-me. - disse Che ao sargento Mário Téran, ao ver que a sua cabeça se baixava, que os olhos do sargento fugiam ao confronto com os seus próprios olhos.
O sargento não se sentia nada bem. Quase vomitava e deixara de ver.
- Acalme-se e faça bem a pontaria. Vai matar um homem... - foram, segundo reza a história, as últimas palavras de Ernesto.
Ironia do destino. Mário Terán submeteu-se, o ano passado, em Cuba a uma operação às cataratas. Os filhos da revolução de Ernesto Guevara devolveram a vista ao seu assassino. Acho que ele teria gostado de saber...


Relembro os Diários de Motocicleta. Foi aí que fiquei a saber mais sobre este médico, Ernesto Guevara.


E, porque já todos, em alguma altura das nossas vidas, trauteámos (pelo menos) o ..."de tu querida presencia / comandante Che Guevara" fica a melodia e os versos de Carlos Puebla, cantados por Soledad Bravo:



Aprendimos a quererte / desde la histórica altura
donde el sol de tu bravura / le puso un cerco a la muerte.

Aquí se queda la clara, / la entrañable transparencia,
de tu querida presencia / Comandante Che Guevara.

Tu mano gloriosa y fuerte / sobre la historia dispara
cuando todo Santa Clara / se despierta para verte.

Aquí se queda la clara, / la entrañable transparencia,
de tu querida presencia / Comandante Che Guevara.

Vienes quemando la brisa / con soles de primavera
para plantar la bandera / con la luz de tu sonrisa.

Aquí se queda la clara, / la entrañable transparencia,
de tu querida presencia / Comandante Che Guevara.

Tu amor revolucionario / te conduce a nueva empresa
donde esperan la firmeza / de tu brazo libertario.

Aquí se queda la clara, / la entrañable transparencia,
de tu querida presencia / Comandante Che Guevara.

Seguiremos adelante / como junto a ti seguimos
y con Fidel te decimos: / hasta siempre Comandante.

Aquí se queda la clara, / la entrañable transparencia,
de tu querida presencia / Comandante Che Guevara.


segunda-feira, outubro 01, 2007

# CCXVIII - ... y el vivo a la travesura!


(Foz do Porto, Agosto de 2006, dia de S. Bartolomeu)

Quando chega Outubro, lembro-me da ansiedade vivida em tempos idos, de miúdo para quem a escola era o escape à monotonia dos dias loooooooongos de férias que não tinham mais fim. Eram tão grandes, as férias, que até chateavam...

E recordo que, de todos, o mês favorito era o Outubro. O Outubro dos meus anos, dos anos da minha mãe (pensava agradar-lhe dizendo que gostava mais do mês em que ela fazia anos!), das vindimas (que cumpriam calendário, em Outubro, sempre)... e do regresso à escola. Ao cheiro dos livros novos (cheios de segredos, de histórias novas, extractos de outras histórias maiores - como seriam?), aos cadernos, às imensas folhas em branco esperando que eu as preeenchesse - que lhes depositasse as minhas confidências, os meus sonhos e devaneios - usando outras esferográficas, outros lápis de cor, outros marcadores de feltro, outros guaches e, até, tinta da china!

Ainda hoje gosto do mês de Outubro. Haverá lá melhor maneira maneira de começar um qualquer mês? Atribuir ao primeirinho dos seus dias o DIA MUNDIAL DA MÚSICA!!!

Pensei muito em que música poria neste post...andei pelos clássicos vocais, pelos instrumentais, por eruditas, pela world music e afins. Por aquelas músicas que resistiram ao passar dos (muitos) anos, pelas que são hinos conhecidos em grande parte do mundo... e detive-me na música popular. A que se faz pelo prazer de a tocar/cantar/partilhar, sem haver interesses financeiros associados. E dei por mim a pensar em coretos... e em bandas. N' A banda do Chico, em várias línguas... e nesta do Don Antonio Aguilar, cantada pela Graciela Beltrán - Que Me Entierren Con La Banda!

É isto! É isto que a música me traz...alegria de viver, o incentivo de dizer não às minudências comezinhas da vida...seguir adiante!!!



Que Me Entierren Con La Banda



El dia en que yo me muera
que me entierren con la banda
que no me anden con lutitos
que es pura propaganda.

Mi vida siempre es alegre
siempre andando de caramba
por eso quiero me lleven
paseando-me con la banda.

Y al tranco de un buen caballo
y al son de una balacera
con diez cajas de cerveza
y la joven que yo quiera.

Me gusta rifar mi suerte
y jugarme hasta la vida
para curarme las heridas
con mi negra consentida.

La noche siempre es bonita
para empezar las parrandas
y amanecer por las calles
paseandome con la banda

Soy de puro sinaloa
donde se rifan los hombres
yo me paseo con la banda
brindando con mis amores

Me gusta jalar la banda
por todita la region
me alegra tratar amigos
que le sobre corazon

el muerto a la sepultura
y el vivo a la travesura
la mujer que va creciendo
que deje de ser criatura

Ya con esta me despido
amigos de las parrandas
yo solamente les pido
que me entierren con la banda.





domingo, setembro 23, 2007

# CCXVII - São cem anos*


(Francisco de Goya y Lucientes -The Old Woman with a Mirror)



A Dona Canô completou, no domingo passado, 100 anos.
Esse nome conheci-o no canto da Daniela Mercury "Dona Canô chamou, eu vou..." e no "venha ver aquele preto de que você gosta".
Mãe de Caetano Veloso e de Maria Bethânia (entre outros, incluindo duas adoptivas, ou de criação). Aliás, é de uma destas que Caetano fala quando escrevia, no exílio, “Eu quero ir minha gente, eu não sou daqui/ eu não tenho nada/ quero ver Irene dar sua risada”.
A festa foi grande em Santo Amaro da Purificação (aprendi o nome desta terra na voz de Bethânia).
Gostei de saber que na missa desse domingo, em que Dona Canô apareceu, Maria Bethânia homenageou a sua mãe cantando. Que emoção terá sido!
Do seu cd "à Senhora dos Jardins do Céu", retirei duas faixas e "mixei-as". Na primeira parte, ouve-se a própria dona Canô orando a Ladainha de nossa Senhora. Depois, entra a filha cantando Oferta de flores.
Imagino Bethânia a cantar este tema, a pensar na sua mãe e a deixar uma lágrima correr pelo seu rosto. Sempre acreditei que cantar é rezar duas vezes!


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* Dedicado à Vó Maria, que neste Dezembro passado, a pouco mais de um mês de ser centenária, nos deixou. Foi devolvida à terra no dia da Nossa Senhora da Conceição - 8 de Dezembro. Deixou-nos também tanta coisa... tanta...



domingo, setembro 16, 2007

# CCXVI - E almejar a liberdade...


(Quem nos segura o mundo? Agst/07)


"Lascia ch'io pianga" é uma belíssima ária da ópera Rinaldo, de Georg Friedrich Händel.
Mais uma luta entre cristãos e muçulmanos...entre o bem e o mal...
"Deixe-me chorar o meu cruel destino e desejar a liberdade", suplica a princesa Almirena, à feiticeira que a aprisionara.

Que esse desejo de liberdade não se nos esmoreça nunca!


O tema foi interpretado pela Callas e por muitos, muitos outros. A voz eleita é do (incomprensivelmente) pouco conhecido, e extremamente versátil, Edson Cordeiro, no seu álbum Contralto. Uma voz única no mundo, capaz de maravilhas espantosas! Um nome a fixar e a descobrir urgentemente, se for caso disso...



"Lascia Ch'io Pianga"

Lascia ch'io pianga mia cruda sorte,
E che sospiri la libertà!
E che sospiri, e che sospiri la libertà!
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte,
E che sospiri la libertà!
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte,

E che sospiri la libertà!
E che sospiri, e che sospiri la libertà!
Lascia ch'io pianga mia cruda sorte,
E che sospiri la libertà!

Il duolo infranga queste ritorte
de miei martiri sol per pietà,
de miei martiri sol per pietà.



domingo, agosto 26, 2007

# CCXV - Um amor e uma cabana


(Figueira da Foz, Agosto de 2007)


O ideal de um amor e uma cabana abandona-nos quando a vida nos dá a conhecer todos os seus lados. Mas este sentimento faz parte da história de muitos de nós.

Esta introdução vem a propósito da canção deste post (Sem vintém) que faz parte do mais recente álbum do grupo Ala dos Namorados, cuja carreira acompanho atentamente desde que apareceram em 1994. Neste trabalho, Mentiroso Normal, Nuno Guerreiro apresenta-se com uma maturidade vocal irrepreensível. Ora apreciem...

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SEM VINTÉM

Eu sei que o meu amor não tem vintém
Depois, o que é que tem, o que é que tem?
Eu sei que a sua vida é um vai-vem
Depois, o que é que tem, o que é que tem?
Mas eu que sei o quanto me quer bem
Vou contar tudo o que meu amor tem:

Tem gemas no olhar
E açúcar no falar
Gotinhas de limão à flor da pele
Faz bolo de amassar
Trouxinha de enrolar
Ninguém me adoça tanto como ele

Eu sei que o meu amor não tem vintém
Depois, o que é que tem, o que é que tem?
Eu sei que toda a terra é sua mãe
Herdou todo o amor que a terra tem.
E eu que sei mais dele que ninguém
Vou contar tudo o que meu amor tem:

Tem mãos de pianista
Pernas de equilibrista
E o casulo da fé no coração
Ele não tem mais nada
Mas diz que de mão dada
Os dois vamos dar volta à situação.




sábado, agosto 18, 2007

# CCXIV - Anjo da Guarda




Para mim, do melhor que as férias têm é o proporcionarem dias de uma bem maior proximidade com os que vivem connosco todo o ano e com quem podemos, agora, soltar palavras ao vento.

É este tempo, sem tempo contado, de conversas loooooooooongaaaasssss e encantadoras.

É descobrir que a filha mais nova (T), que completou os 3 anos em Maio passado, já conhece as letras maiúsculas TODAS! Ah, pequeno computador do Noddy, que vales ouro!

É ouvir a conversa entre esta filha e a irmã do meio (F, 13 anos):

T - Huuuum! Este iogurte tem um sabor do outro mundo!

F (notoriamente espantada) - Onde foste buscar isso????

T ( com aquele ar de quem diz Daaaaaah!) - Ao frigorífico, claro!

E é olhá-los e desejar, para cada um deles, o melhor deste mundo.

E, com olhos já mais aguados, lembrar de um quadro que via em muitas paredes pendurado, nos meus tempos de meninice (o reproduzido em cima!). E relembrar a canção (que continuo a preferir na voz da Ana Deus, dos Três Tristes Tigres, como podem ver na versão que partilho) do António Variações - Anjo da Guarda. E pensar que cada um dos meus filhos adormeceu comigo a cantar-lhe (entre outras) esta canção.

E querer muito, muito, muito... acreditar que cada um tenha um Anjo da Guarda a guardar os seus passos, as suas decisões, as suas opções...

Ainda que esse Anjo da Guarda seja apenas, lá no coração de cada um, resquícios das nossas conversas em tempo de férias...

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Eu tenho um anjo
Anjo da guarda
Que me protege
De noite e de dia
Eu não o vejo
Eu não o oiço
Mas sinto sempre a sua companhia


Eu tenho um guarda
Que é um anjo
Que me protege
De noite e de dia
Não usa arma
Não usa a força
Usa uma luz com que ilumina a minha vida

Ele não, não usa arma
Ele não, não usa a força
Usa uma luz com que ilumina a minha vida



domingo, julho 29, 2007

# CCXIII - Folclore mexicano

Numa noite desta semana - quarta-feira, para ser mais exacto - fiz uma viagem pelo mundo fora, no Mercado Ferreira Borges. Muito bem organizado pelo Rancho Folclórico de Paranhos, o XXVII Festival Internacional de Folclore da cidade do Porto.
Nessa noite, participaram seis representações internacionais : a Polónia, a Moldávia, a Letónia, a Ucrânia, o Chile e o México.
Um dos momentos altos, tradicionais nestes festivais, foi o cantar dos respectivos hinos nacionais. Arrepiante, a postura dos elementos quando se cantavam os hinos, sobretudo os que respeitavam aos próprios países. Traduziram muito do amor de cada um pela sua pátria. Emocionante, o público de pé, no decorrer destes exaltamentos. E todo o público a cantar o hino de Portugal...
Cada grupo dava-me alvas asas e eu voava para longe dali.
Claro que o México, com aquela mescla de cores, me fez revisitar todo um país onde nunca estive e que reside num canto da minha memória afectiva. Lindo demais.
Uma imagem e um vídeozinho, para partilhar convosco:






A excelente apresentação de Fernando Pino mudou para sempre o meu sentir ao ouvir o tema Besame Mucho, da Consuelo Velazquez (escrita aos 16 anos!). Sempre pensei nela como uma canção de despedida, de receio de despedida, sim, mas entre amantes...
O apresentador realçou o que todos sentíramos no sentimiento daquele jovem mexicano cantando com toda a sua alma, emocionado até às raízes dos cabelos... e explicou: aquela canção de sucesso mundial, não tinha nada a ver com sensualidades, com amantes, com o que associamos ao caliente dos boleros... O que a autora pretendia contar era o que uma mãe, no próprio leito da sua morte, cantava ao filho, que sentia que ia deixar para trás. A situação inversa, curiosamente, do post do outro dia, Pedaço de Mim.




Besame, besame mucho
como si fuera esta la noche
la ultima vez


Besame, besame mucho
que tengo miedo a perderte
perderte despues



Besame, besame mucho
como si fuera esta la noche
la ultima vez


Besame, besame mucho
que tengo miedo a perderte
perderte despues



Quiero tenerte muy cerca
mirarme en tus ojos
verte junto a mi


Piensa que tal vez mañana
yo ya estare lejos,
muy lejos de aqui



Besame, besame mucho
como si fuera esta noche
la ultima vez


Besame, besame mucho
que tengo miedo a perderte,
perderte despues

domingo, julho 22, 2007

# CCXII - Kitsch q.b.


(E um tempo sem tempo contado...)

Nesta altura o desejo de férias é uma constante nas horas que vou contando, uma a uma, à espera de Agosto.
E uma canção antiga teima em lembrar-mo... e vocês, lembram-se desta canção?


Natércia Barreto - Óculos De Sol


Já arranjei muito bem / Tudo quanto convém
P’ra praia levar
O pente, o espelho, o baton
E o creme muito bom / P’ra me bronzear
Tenho o meu rádio portátil / E o bikini encarnado
Também está no meu rol
E como é bom de ver
Não podia esquecer / Os meus óculos de sol

Refrão:
Que levo p’ra chorar uuuuhuh / Sem ninguém ver
P’ra não dar uuuuhuh / A perceber
P’ra ocultar uuuuhuh / O meu sofrer
Pois eu sei que te hei-de encontrar
Talvez deitado à beira-mar / Com outra ao lado
E eu vou passar / A tarde a chorar

Já pensei não sair / Mas aonde é que eu hei-de ir
Com este calor?
O que é que eu hei-de fazer
P’ra não ter que te ver / Com o teu novo amor?
Ver-te-ei com certeza / Mas eu peço à tristeza
Um pouco de controle
E pelo sim pelo não
Eu vou ter sempre à mão / os meus óculos de sol

Refrão

Vou chorar Uuuuh uh / Vou sofrer Uuuuh uh
Vou chorar Uuuuh uh






domingo, julho 08, 2007

# CCX - Follow the Songlines

Na Praça da Casa da Música, no Porto, em 7/7/7:

(Em pleno espectáculo...)


Enquanto o resto do mundo se maravilhava em conjuntos de 7, eu e uns quantos mais deliciávamo-nos com os 6 contrabaixos, os 8 violoncelos, os 25 violinos (I e II), as 9 violas, as 3 flautas, os 3 oboés, os 3 clarinetes, os 2 fagotes, as 4 trompas, os 3 trompetes, os 3 trobones, a tuba e os tímpanos, as percusões dos 4 profissionais e a harpa...tudo da Orquestra Nacional do Porto e convidados (entre eles, destacadíssimos, Christophe Wallemme, num contrabaixo e Helge Norbakken, na percussão). A esta maravilha viva, juntavam-se os pianos de Diederik Wissels e do Mário Laginha. A direcção musical foi assumida pelo Dirk Brossé e as vozes do excelente David Linx e da suprema Maria João.

Tanto quanto contou a Maria João, este espectáculo tivera lugar, há cerca de duas semanas atrás, em Bruxelas, com a orquestra lá da zona.

O superior nível do espectáculo apresentado, fez-me pensar numa digressão mundial... de sucesso garantido, entre os amantes do género.

Este evento realizou-se na Praça da Casa da Música, sob um frio de fazer bater os dentes. A brisa era polar!!! Só o calor do desempenho dos artistas nos aquecia.

As pautas e letras das canções eram fixadas, para não voarem, recorrendo-se à última tecnologia:

Gostei também de, finalmente, conhecer alguns dos membros do Clube de Fãs da Maria João. E não gostei dos penetras que, da escadaria, assistiam ao espectáculo sem pagar bilhete! Detesto esperteza saloias...

Aqui a cumplicidade dos donos das vozes:


Aqui a cumplicidade das vozes, com a qualidade possível (clandestina):





sexta-feira, julho 06, 2007

# CCIX - A saudade


(Pintura "La chambre de van Gogh a Arles" de Vincent van Gogh Museu d'Orsay, Paris )


O desaparecimento de um filho, amplamente empolado pelo recente caso da Madeleine McCan, é um dos meus maiores pesadelos.
Não acredito que algum dia fosse capaz de recuperar a (alguma) sanidade mental.
E vejo essa dor na canção de Chico Buarque, Pedaço de Mim, composta para a Ópera do Malandro.
Das várias versões que fui conhecendo, nenhuma iguala a da Simone. Ninguém diz/canta como ela " A saudade é arrumar o quarto / do filho que já morreu"


Pedaço de Mim / Simone



Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar


Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais


Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu


Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
E é assim como uma fisgada
No membro que já perdi


Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus



terça-feira, junho 26, 2007

# CCVIII - Os Mourisqueiros

Desta vez, ficam algumas imagens ligadas aos mourisqueiros:


Enquanto os chapéus repousam debaixo do seu castelo...



... os mourisqueiros, valentes, guerreiam disparando tiros (altíssimos) contra os bugios...


... sem deixar de dialogar com o inimigo (o cavaleiro recolhe mais uma mensagem, na sua espada, para entregar aos bugios)...


... mas são obrigados a partir para a guerra e tentar tomar de assalto o castelo do inimigo (uma vez que este não lhes cede a estátua pretendida do santo milagreiro).

segunda-feira, junho 25, 2007

# CCVII - S. João de Sobrado (2007)



Sem qualquer edição, um apanhado do imenso colorido da melhor festa popular do mundo e arredores!

domingo, junho 24, 2007

# CCVI - Uma das Quintas de Leitura


(Trabalho de autor)

Nesta última quinta-feira, 21/06/07, fui atraído por uma Quinta(s) de Leitura, do Teatro Campo Alegre, no Porto.
A temática era "amantes e outros nomes de família" - e ia lá estar a Aldina Duarte. Imperdível, portanto.


Bilhetes esgotadíssimos. Será que alguém desiste? E fui esperando... Alguém deixou de vir, entrei.


A noite começou com o que a apresentadora/conversadora, Maria João Seixas, chamou "uma liturgia do beijo". João Galante e Ana Borralho fizeram Uníssono. Um beijo tal que, e mais uma vez Maria João dixit, venceria qualquer um daqueles dos cinemas, quando os cinemas competiam por apresentar o mais longo beijo.
Mal acabou o Uníssono - e durou q.b. - começou a conversa entre a Maria João Seixas (MARAVILHOSA!) e a poeta convidada Maria do Rosário Pedreira.
A Maria João pediu à poeta que lesse um texto, em prosa, dum autor que aprecia muito e que, segundo ela, conseguiu, como ninguém, escrever sobre isso da poesia.
Tudo o que se seguiu foi algo de inexplicável. A Maria João Seixas ainda a surpreender, com um sentido de humor irrepreensível e uma condução de conversa soberba. "Quando adolescente, eu era gorda, tinha acne e gaguejava. As minhas amigas eram elegantes e não conseguiam compreender por que tinha eu todos os namorados que queria." E contou-nos o seu segredo. "Ainda hoje o uso. Serve para tudo. Para a vida social, para a política, ...". E nós rendidos, encantados, presos nos seus dizeres.
Era óbvia a admiração que nutria pela poeta (SIMPÁTICA!). E pela poesia que segundo ela "escolhe os poetas, e não o contrário". E falava do lugar mais alto da poesia - acima da filosofia. E confessou-nos que ninguém como esta poeta fala tão bem de decotes!
A poeta surpreendeu pela autenticidade. Por carregar uma simplicidade que só alguns conseguem. Por confessar que só sabe trabalhar com letras. Se perdesse a profissão de editora, não saberia o que fazer... "Não sei cozinhar, nem...".
E contou-nos a importância do primeiro verso, que surge em qualquer altura... até mesmo no supermercado. E do trabalho laboratorial que vem depois. E do ler em voz alta o que escreve... e do achar, muitas vezes, que a sua poesia dita por outros não tem a mesma musicalidade - daí a importância do ler em voz alta, do fazer presente a musicalidade do poema. E (como eu adorei isso!) dizer que outos lêm a sua poesia, descobrindo coisas que ela não pôs lá! Lembrou que escreveu os primeiros versos muito cedo, em idade, "rimando limão com coração". E ficou pensativa, hesitando, acautelando a resposta, quando a Maria João lhe perguntou "Quem és?".


A noite estava quase perfeita.

Então o Pedro Lamares (que encenou teatros, há uns tempos), a Romi Soares, a Susana Menezes a a própria Maria do Rosário Pedreira disseram alguns poemas escolhidos pela poeta. Percorremos um pouco da sua intimidade.

Depois de um curtíssimo intervalo, e depois de mais um poema dito pela Maria do rosário Pedreira, entrou em palco a Aldina Duarte. (ARTISTA!).
Um fado, outro e mais outro... percorrendo os seus dois cd's, aprisionando-nos na envolvência daquele mundo seu. Até que cantou o "Ai meu amor se bastasse", e soltou-se... e daí para a frente esteve cada vez melhor. A Aldina canta (BEM!) muito e fala pouco.... Mas, desta feita, falou do pânico que sentia por estar quase a estrear em público um novo fado, com música de fado tradicional e tendo, como letra, um poema da poeta convidada. Foi um privilégio assistir, partilhar este momento. Lindíssimo este novo tema.

A noite ficou perfeita.

Mais ainda quando, sorrindo com a alma, a Aldina disse "Gosto tanto de cantar no Porto!". E nós acrescentaríamos, gostamos tanto de a ouvir cantar no Porto!


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Para ouvir, do álbum Crua, o tema Xaile encarnado:



Xaile Encarnado
Letra: João Monge / Música: Armandinho (Fado da Adiça)


Eu tenho um xaile encarnado
É uma lembrança tua
Tem um segredo bordado
Que às vezes eu trago à rua


Tem as marcas de uma vida
Que a vida marca no rosto
Mas ganha uma nova vida
Nas noites que o trago posto


Já foi lençol e bandeira
Vela de barco também
Tem marcas da vida inteira
Mas dizem que me cai bem


Se pensas que me perdi
Nalgum destino traçado
Para veres que não esqueci
Eu ponho o xaile encarnado




domingo, junho 17, 2007

# CCV - Introducing... Thalia Zedek


(La Mariee de Marc Chagall)


Em Nothing Hill, este quadro é uma das estrelas do filme ("Happiness isn't happiness without a violin-playing goat"). E a música podia bem fazer parte da sua banda sonora.

Por ficar demasiado preso aos originais, as versões deixam-me de "pé atrás".
Esta da Thalia Zedek, no alto dos seus mais de vinte anos de estrada, convence-me. Totalmente.


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"Dance Me To The End Of Love" (Original do Sr. Leonard Cohen)

Dance me to your beauty with a burning violin
Dance me through the panic 'til I'm gathered safely in
Lift me like an olive branch and be my homeward dove
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love
Oh let me see your beauty when the witnesses are gone
Let me feel you moving like they do in Babylon
Show me slowly what I only know the limits of
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love

Dance me to the wedding now, dance me on and on
Dance me very tenderly and dance me very long
We're both of us beneath our love, we're both of us above
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love

Dance me to the children who are asking to be born
Dance me through the curtains that our kisses have outworn
Raise a tent of shelter now, though every thread is torn
Dance me to the end of love

Dance me to your beauty with a burning violin
Dance me through the panic till I'm gathered safely in
Touch me with your naked hand or touch me with your glove
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love
Dance me to the end of love



domingo, junho 03, 2007

# CCIV - O Dianho da Bruxa


(E todos cantaram, enlevando-nos...)


Ontem, à noitinha, no Palácio de Cristal, enquanto ao lado decorria mais uma feira do Livro, no auditório da Biblioteca Almeida Garret pudemos viajar por terras transmontanas e altodurienses duma forma absolutamente mágica, tendo ao leme o Núcleo de Etnografia e Folclore da Universidade do Porto (ex NEFAP, actual NEFUP). Um espectáculo riquíssimo, muito bem preparado e, sobretudo, muito sentido por cada um dos seus performers.
Tivemos danças, cantares, recriações de conversas de outrora, de tradições perdidas no tempo, de mundos masculinos e femininos, de ligações sempre presentes à terra. Ouvimos O povo de Eça de Queirós, poemas do Miguel Torga e um pedacinho do seu Reino Maravilhoso.
Revi um álbum de referência na música portuguesa (o Traz os montes, de 1994, da Né Ladeiras). Revi todo um mundo de bruxas, de lutas entre o bem e o mal, de pastores e ovelhas, de dobadoiras e malhos, de eiras e desfolhadas, de campos e bois, de rios e montes, de histórias e lendas, de cantigas e adivinhas, ...
Obrigado MLuz, pelo convite. Parabéns NEFUP!!!



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Um extracto deles no Tirioni (Cantiga tradicional de Miranda do Douro) e num Conto*:






Cunta - L'home que num tenie quei comer


Era ua beç un tiu que nun tenie quei comer i dixo que le fússen a anterrrar bibo. Íban an ne l meio de l caminho i ancontrou un spanholo:
- Conho, que yê isso, para anterrar I muchacho bibo?
- Diç que nun tenei quei comer!
I ei que diç assi:
- Conho, que se buôlba atrás i you dou-le un farnel de pan!
I el que alhebanta la cabeça i diç assi tan sério:
- Crudo ou cozido?
- Conho, pos crudo!
- Ala, anton siga la procisson!
Nien crudo I quijo aceitar!

quarta-feira, maio 30, 2007

# CCIII - Tivemos tudo


(Algures da net)


Geralmente não é assim, mas acontece haver canções que me prendem pela melodia. A letra vem, porque vem quase sempre, tempos depois.
Foi assim com esta versão do Le Moribond, de Jacques Brel.
Como se de uma lição de vida se tratasse, realça o que, afinal, da vida se leva. Aquilo a que se dá deveras importância no momento da retrospectiva final...
Ouvi as versões dos Mamas and Papas, dos Nirvana, do Cat Stevens, dos Westlife...e fiquei pela mais conhecida, do Terry Jacks.



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Terry Jacks - Seasons in the sun

Goodbye to you, my trusted friend.
We've known each other since we're nine or ten.
Together we climbed hills or trees.
Learned of love and ABC's,
skinned our hearts and skinned our knees.
Goodbye my friend, it's hard to die,
when all the birds are singing in the sky,
Now that the spring is in the air.
Pretty girls are everywhere.
Think of me and I'll be there.
We had joy, we had fun, we had seasons in the sun.
But the hills that we climbed
were just seasons out of time.

Goodbye, Papa, please pray for me,
I was the black sheep of the family.
You tried to teach me right from wrong.
Too much wine and too much song,
wonder how I got along.
Goodbye, Papa, it's hard to die
when all the birds are singing in the sky,
Now that the spring is in the air.
Little children everywhere.
When you see them I'll be there.
We had joy, we had fun, we had seasons in the sun.
But the wine and the song,
like the seasons, have all gone.

Goodbye, Michelle, my little one.
You gave me love and helped me find the sun.
And every time that I was down
you would always come around
and get my feet back on the ground.
Goodbye, Michelle, it's hard to die
when all the birds are singing in the sky,
Now that the spring is in the air.
With the flowers ev'rywhere.
I whish that we could both be there.
We had joy, we had fun, we had seasons in the sun.
But the stars we could reach
were just starfishs on the beach